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Contos e parábolas

Pequenos Milagres Judaicos VIII

de Yitta Halberstam e Judith Leventhal

 

Em 1989, eu fazia parte do grupo de 33 homens que viajaram do Brooklyn para Londres para participar do
casamento de Naftali, o filho de nosso rebe (rabino). Nós passamos vários dias no reduto chassídico de Stamford
Hill, participando de várias celebrações em honra ao casamento e nos sentido privilegiados por podermos conceder
tal honra ao nosso mestre espiritual.
Quando finalmente chegou o dia de voltarmos para casa, nós paramos na casa do rebe para uma despedida
formal. Nós informamos ao seu gabai (assistente) que estávamos com o horário apertado, e que tínhamos de estar
no aeroporto de Heathrow em duas horas para pegarmos o nosso voo. O gabai acenou em entendimento e disse
cordialmente:
— Isso não será problema. Acontece que o rebe está livre neste momento; ele poderá encaixá-los. Vou informá-
los de que vocês estão aqui e tenho certeza de que ele irá vê-los imediatamente.
Mas, quando o gabai retornou do escritório do rebe, não fez nenhuma menção de nos conduzir para dentro.
Franzindo a testa, disse em um tom humilde:
— O rebe disse que vocês devem aguardar.
Apesar de o gabai ter nos dito momentos antes que o rebe estava livre, não ficamos nem surpresos nem
ofendidos. Pensamos que o rebe estava se preparando para nossa audiência meditando ou mesmo rezando.
Tínhamos certeza de que ele nos chamaria em alguns instantes. Porém, quando já haviam se passado trinta minutos
e nós ainda nos encontrávamos sentados na ante-sala, começamos a ficar ansiosos. Um de nós foi chamar o gabai e
perguntar sobre a demora.
— Eu vou lembrar ao rebe mais uma vez – disse prontamente o gabai. — Certamente ele me dirá para trazê-los
imediatamente.
Contudo, mais uma vez o gabai saiu da sala do rebe com um ar perplexo.

— Sinto muito – ele encolheu os ombros, parecendo confuso e embaraça-do –, mas o rebe diz que vocês ainda
devem esperar.
Neste ponto, já estávamos começando a ficar agitados. Este era um comportamento muito atípico do rebe, que
era conhecido por sempre manter a pontualidade. Além disso, ele era uma pessoa extremamente humilde e modesta,
muito respeitoso com as necessidades de seus seguidores, e jamais deixaria alguém esperando por sua própria
vontade. Entretanto, o mais estranho de tudo era o fato de o gabai já ter nos avisado que o rebe estava estudando
sozinho. Então, não podíamos deixar de nos perguntar o que estava fazendo com que o rebe não nos recebesse?
— Com licença – disse respeitosamente ao gabai um dos chassidim (seguidores de um rebe). — Será que o rebe
está doente?
O gabai balançou a cabeça negativamente.
—Ele está rezando?
— Não! – respondeu o gabai, impaciente.
— Então o que ele está fazendo lá dentro? – perguntou outra pessoa, rispidamente.
O gabai encolheu os ombros e saiu da sala.
Assim que ele saiu, todos começaram a sussurrar, nervosos.
— Acho que não temos outra escolha senão levantar e ir embora agora! – sugeriu um homem. — Caso contrário,
iremos perder o avião!
— Nem pense nisso! – protestou outro. — O rebe ficaria profundamente ofendido!
Quase todos tomaram partido da segunda opinião. Não havia nenhuma maneira de irmos embora. Tínhamos de
ficar e torcer para pegarmos o avião.
Quando finalmente o gabai nos conduziu ao escritório do rebe, fomos calorosamente recebidos pelo nosso
mestre, mas nenhuma desculpa pelo atraso injustificado saiu de seus lábios. Isso também era estranho e nada típico
de nosso rebe, que também era conhecido por respeitar o horários das pessoas, a ponto de se desculpar
profusamente por fazer alguém esperar cinco minutos! Ele nos havia feito esperar por quase uma hora, mas nem
pedira desculpas nem oferecera uma explicação! Muito estranho, nós todos concordamos.
Assim que a audiência com o rebe terminou, todos nós corremos para o ônibus alugado com a finalidade de nos
levar ao aeroporto e nada educadamente gritamos para o motorista ir rápido, bem rápido. Porém, nossas incitações
de nada adiantaram. Logo nos deparamos com um congestionamento que parou Heathrow, e nossa esperança de
pegar o avião ficou cada vez mais distante…
Ao chegarmos ao aeroporto, fomos informados de que o avião – o último que seguia para Nova York naquele dia
– tinha acabado de decolar. Ficamos inconsoláveis! Muitos de nós eram empresários e tinham importantes reuniões
agendadas para o dia seguinte; outros tinham casamentos ou festas de bar-mitsvá de familiares na noite seguinte.
Ficamos frustrados, chateados e bravos.
Porém, uma hora depois, os lamentos pararam e se transformaram em orações de agradecimento.
O avião que nós tanto lamentamos ter perdido explodiu tragicamente enquanto sobrevoava Lockerbie, na Escócia.
A tragédia que se abatera sobre os passageiros era dura demais para ser compreendida.
Sentimos angústia e horror por aqueles que estavam a bordo; ficamos mudos diante da desgraça. Mas, ao
mesmo tempo, não podíamos deixar de agradecer ao rebe e à mão de Deus que poupara nossas vidas.

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