No dia 28 de Iyar comemora-se a reunificação de Jerusalém, com o retorno da Cidade Velha, o Monte do Templo e o Muro das Lamentações (Cotel Hamaravi) à soberania judaica, pela primeira vez desde o ano 70 da era comum.
Os acontecimentos que conduziram a essa realização miraculosa, na chamada “Guerra dos Seis Dias”, refletem não somente uma façanha militar, mas também um acontecimento de profundo significado religioso. A data foi estabelecida como Iom Ierushaláyim e a forma da celebração religiosa deste evento ainda está sendo elaborada.
3.000 anos de Jerusalém
“Se eu te esquecer, ó Jerusalém,
Que se esqueça a minha destra de sua habilidade.
Que se pegue minha língua a meu paladar,
Se eu não me lembrar de ti,
Se não preferir Jerusalém à minha maior alegria.”
Esses versos do Salmo l37, chorando a saudade de Jerusalém durante o exílio babilônico, traduzem, de maneira bastante clara, a ligação permanente entre o coração de cada judeu e a cidade de Jerusalém.
Nela está o que restou do Templo de Salomão – o Muro Ocidental, também chamado de Muro das Lamentações.
Conta a tradição que, ao decidir construir o Templo, quis Salomão que não fosse apenas sua a obra, mas de todo o povo, e por isso o convocou a participar, cada qual da maneira que seus recursos lhe permitissem. Alguns trouxeram ouro, prata, madeiras preciosas, tecidos; outros contrataram artífices e artesãos dos mais renomados. Os pobres, aqueles que poucos recursos tinham, resolveram, trazer, com muito esforço, as maiores pedras que pudessem carregar. Com essas pedras foi construído o Muro Ocidental, e foi dito que ele jamais seria destruído, pois a Shechiná – a Presença Divina – sempre pairaria sobre ele.
Com a destruição do Segundo Templo pelos romanos, os serviços Divinos que lá se realizavam com as oferendas de Corbanot (sacrifícios) foram substituídos pelas preces, individuais e coletivas, e pelas cerimônias religiosas realizadas nas sinagogas, sempre dedicando parte da liturgia a lembrar o Templo Sagrado.
Por quase 2000 anos esteve o Monte do Templo fora de mãos judias, sendo que, em alguns períodos da história, os judeus estiveram até mesmo impedidos de ter acesso ao local que lhes era tão sagrado.
Uma tradição contava que, um dia, os judeus voltariam ao Monte do Templo e, ao se realizar esse acontecimento, soaria um toque de Shofar (chifre de carneiro) tão extraordinário que seria ouvido no mundo inteiro.
Desde a proclamação do Estado de Israel, em 1948, que logo estabeleceu Jerusalém como sua capital, a cidade estava dividida. Numa parte estavam os judeus e na outra, contendo a parte velha de cidade (chamada mesmo de Cidade Velha), os jordanianos. Na Guerra dos Seis Dias, enfrentado árdua luta, os paraquedistas de Israel avançaram pelas ruelas da Cidade Velha. Repórteres do mundo inteiro os acompanhavam, transmitindo através de seus microfones, ao vivo, tudo que se passava. Eis que, num momento glorioso, conseguem os paraquedistas chegar até o Muro, que até então era proibido aos judeus, e pela forma tradicional de marcar eventos importantes, foi tocado o Shofar pelo Rabino Goren (capelão do exército israelense) e o som, transmitido pelos microfones dos repórteres chegou a todos os recantos do mundo, tornando realidade algo que mais parecia um sonho ou uma lenda.
A unificação de Jerusalém tornou o Muro parte essencial de todas as vivências na cidade santa, não somente nas comemorações das datas estabelecidas pelo calendário religioso judaico, mas também nas celebrações familiares.
Diariamente, centenas de pessoas vêm rezar junto ao Muro. Nas datas anuais das antigas peregrinações – Pêssach, Shavuót e Sucót –, mais uma vez se encontram peregrinos, não somente de todos os recantos de Israel, mas, verdadeiramente, de todas as partes do mundo. Shabatot (sábados) são celebrados com renovada alegria e, a qualquer hora do dia, pode-se participar de um minian (quorum de 10 adultos, necessário para poder realizar preces coletivas). Cerimônias de Bar-Mitsvá (celebração de passagem à maioridade religiosa de rapazes que alcançam l3 anos) são festejadas no Cotel (Muro) por famílias que chegam de todos os países onde há judeus. Bodas de Prata ou de Ouro passam a ter significado mais profundo quando ali celebradas. Rabinos de várias ieshivot estão sempre presentes, buscando aproximar-se de jovens que, às vezes, vêm ao Cotel apenas para cumprir um passeio turístico e que, por mais distantes que estejam da religião, encontram novamente, por meio de suas orientações, seus laços com a tradição milenar de seu povo.
Toda a cidade de Jerusalém transmite uma espiritualidade, que se manifesta, não somente junto ao muro, mas, também, nas dezenas de ieshivot (escolas de formação religiosa) espalhadas por todos os bairros. Alguns, como Mea Shearim, fazem recordar cidades da Europa de antes da Segunda Guerra. Outros, com sua arquitetura moderna, demonstram que tecnologia e fé podem estar lado a lado.
Estudantes de avançados centros universitários, técnicos, comerciantes, professores, médicos, advogados, engenheiros, todos se unem fraternalmente nos momentos de prece.
Pela tradição judaica, o Monte Moriá (Monte do Templo) é o ponto central da criação do Mundo. Foi ali que Abrahão trouxe seu filho Isaac para ser ofertado como sacrifício ao Eterno, e ali recebeu a ordem de não consumar o sacrifício e teve renovado seu pacto com o Eterno.
Foi o local escolhido por David para erigir o Templo, que foi depois construído por Salomão. Após sua destruição, o Segundo Templo foi reerguido sobre as ruínas do primeiro. Escavações continuadas nos fazem, cada vez mais, entrar em contato com os eventos que ali se passaram.
Jerusalém foi conquistada pelo Rei David, quando venceu os jebuzeus, e ela se tornou sua capital, a Cidade de David, por volta de 1.000 anos antes da era comum. A construção do Templo no terreno comprado pelo Rei David ao rei dos jebuzeus e o apogeu da cidade veio a ocorrer sob o reinado de Salomão, 50 anos depois.
Em 701 antes da era comum, o Rei Ezekias fortificou a cidade e construiu condutos subterrâneos para abastecê-la de água.
Em 586, os babilônios destruíram o Templo e conduziram grande parte do povo como cativos à Babilônia;
Em 538, Ciro, o Rei da Pérsia, tendo derrotado os babilônios, promulga um édito autorizando o retornos dos judeus à sua terra.
Em 521, completa-se a construção de Segundo Templo.
Em 444, Nehemias construiu novas muralhas de proteção em volta da cidade.
Em 313, Ptolomeu I, General de Alexandre, o Grande, captura Jerusalém.
Em 167, Antíoco Epifanes profana o Templo e tem lugar a Revolta dos Macabeus, que culmina com a libertação de Jerusalém por Judá Macabeu, cuja vitória é até hoje lembrada na festa de Chanucá.
Em 63 antes da era comum, Pompeu captura Jerusalém e, no ano 20, Herodes inicia uma larga reforma do Templo.
Em 70 da era comum, Tito destrói o Templo e, alguns anos depois, entre l32 e l35, ocorre a revolta de Bar Cochbá que, por curto espaço de tempo, consegue libertar Jerusalém, mas é finalmente derrotado por Adriano.
Entre 614 e 629, há uma breve conquista de Jerusalém pelos persas com ajuda dos judeus, seguida pela vitória de Bizâncio, que reconquista a cidade.
Em 638, Jerusalém se rende ao Califa Omar.
Em 1099, os Cruzados, conduzidos por Godofredo, capturam a cidade.
Em 1187, Saladino toma Jerusalém e permite aos judeus regressar e ali se estabelecer.
Em 1192, Ricardo Coração de Leão firma um acordo com Saladino.
Em 1212, 300 rabinos e seus discípulos chegam da França e da Inglaterra e se estabelecem na cidade.
Em 1244, os turcos de Khwarizmian capturam Jerusalém, terminando o mandato dos Cruzados.
Em 1260, os mamelucos do Egito capturam a cidade e a governam durante cerca de dois séculos e meio.
Em 1267, Nachmânides (grande rabino e erudito) chega da Espanha e reativa a vida judaica, construindo também sua famosa sinagoga.
Em 1516, Jerusalém é conquistada pelo sultão otomano Selim I.
Em 1700, Judá, o Piedoso, com seus 1.000 seguidores, se estabelece em Jerusalém, e em 1827, Sir Moses Montefiore, grande filantropo judeu inglês, faz sua primeira visita a Jerusalém.
Em 1844, o primeiro censo oficial confirma a maioria judia na cidade.
Em l917, Jerusalém se rende ao General britânico Allenby, cujas tropas incluíam uma legião judia.
Em 1925, se dá a inauguração da Universidade Hebraica no Monte Scopus por Lord Balfour, e o discurso inaugural é proferido por Albert Einstein.
Em 1938, é inaugurado o Hospital da Universidade Hadassah, no Monte Scopus (que é evacuado em 1948, depois do massacre de 78 médicos e enfermeiras.)
Em l948, é proclamado o Estado de Israel tendo Jerusalém como sua capital. Entretanto, a Legião Árabe captura a cidade velha, destruindo o bairro judeu e 58 sinagogas.
Em 1967, com a Guerra dos Seis Dias, Jerusalém é reunificada sob a soberania judaica.
Em l977, o Presidente Anwar El Sadat visita Jerusalém e fala no Knesset (parlamento).
Em l996, Jerusalém comemora 3.000 anos.
Em 2010, a Sinagoga Churva, destruída pela Legião Árabe Jordaniana em 1948, é reinaugurada.
Em 2012, a população judaica de Jerusalém ultrapassa meio milhão de habitantes.
Em 2018, a Embaixada dos Estados Unidos da América é transferida para Jerusalém.
O poema a seguir traduz de maneira singular o sentimento dos soldados que libertaram o Cotel do domínio jordaniano.
Paraquedistas choram
Versão livre de um poema de Chaim Chefer
Este muro já ouviu muitas preces e lamentos.
Viu casas e muralhas ruindo.
Sentiu mãos ansiosas escondendo mensagens entre suas pedras.
Assistiu à morte de Judá Halevi, assassinado por profanadores.
Se manteve impassível, enquanto novos césares se erguiam e caíam.
Esteve no centro do desenrolar de tragédias.
Foi palco da marcha triste na história de um povo vencido.
Mas nunca,
Nunca viu, nada que se comparasse a paraquedistas chorando.
Eles vieram, estafados e feridos,
Correndo palpitantes, rugindo e lutando.
Atirando-se como loucos pelas ruelas da cidade velha.
A poeira os cobre, seus lábios tremem,
E eles murmuram “Se eu me esquecer de ti, ó Jerusalém…”
São ágeis como águias, valentes como leões.
Seus tanques são a carruagem de fogo de Eliháu Hanavi
Eles vêm como o relâmpago
Ziguezagueiam entre as balas.
E atiram-se sobre o Cotel
Ei-los com o rosto colado ao muro, beijando suas pedras;
As lágrimas correm e, envergonhados, procuram contê-las.
Por que choram estes lutadores tão valentes
E do choro, passam a cantar com emoção?
Talvez seja porque estes rapazes, tão jovens,
Que nasceram como o renascer de Israel,
Carregam em seus ombros 2.000 anos de esperanças e sonhos,
De martírio e redenção, de desespero e de lutas, de preces e pranto.
E porque, cada um deles, representa milhões de irmãos,
Que não puderam ver seu sonho realizado,
E tombaram com a esperança de que, um dia,
Um dia, deixaria de ser apenas um sonho.
Abençoadas sejam estas lágrimas
Abençoados sejam estes paraquedistas
Que choram ao pé do Cotel Hamaravi libertado.
Trecho extraído da Na Espiral do Tempo – Uma viagem pelo calendário judaico
Autor: David Gorodovits
Editora Sêfer
Páginas: 182
Deliciosa viagem pelas principais datas do calendário judaico, recheada com as inspiradoras e inigualáveis parábolas de David Gorodovits (membro do conselho editorial da Editora Sêfer), que darão aos leitores uma perspectiva plena de sensibilidade sobre o verdadeiro sentido do tempo no judaísmo. Sua leitura tocará fundo na alma daqueles que buscam as eternas e profundas mensagens contidas na Torá.
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