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Parashá Semanal - Leitura da Torá

Responsabilidade mútua

Brevíssima coletânea de comentários sobre a Porção Ki Tavô extraída da obra torá interpretada à luz dos comentários do Rabino Samson Raphael Hirsch recém-publicada pela Editora Sêfer

 

Deuteronômio, Capítulo 28

1 E se ouvires a voz do Eterno, teu Deus, para guardar e cumprir todos os Seus mandamentos que eu te ordeno hoje, o Eterno, teu Deus, te colocará acima de todas as nações da terra. 2 E virão sobre ti todas estas bênçãos e te alcançarão, pois obedecerás à voz do Eterno, teu Deus. 3 Serás bendito na cidade e serás bendito no campo. 4 Será bendito o fruto do teu ventre, o fruto da tua terra e o fruto dos teus animais, a cria de teu gado e os rebanhos de tuas ovelhas. 5 Serão benditos teu cesto e a tua amassadeira. 6 Serás bendito ao entrares e serás bendito ao saíres. 7 O Eterno entregará os teus inimigos, que se levantarem contra ti, vencidos diante de ti; por um caminho sairão contra ti e por sete caminhos fugirão de diante de ti. 8 O Eterno mandará que a bênção esteja contigo nos teus celeiros e em tudo o que estenderes a tua mão; e te abençoará na terra que o Eterno, teu Deus, te dá. 9 O Eterno levantar-te-á para Si por povo santo como te jurou, quando guardares os mandamentos do Eterno, teu Deus, e andares por Seus caminhos. 10 E todos os povos da terra verão que o nome do Eterno é invocado sobre ti, e te temerão.

 

 

  1. E se. No capítulo anterior, o povo foi designado como guardião da Torá e, com base nessa sua função, foi ordenado que, ao chegar à terra, mesmo antes de sua conquista e divisão, escrevesse a Torá sobre as pedras erigidas como altar e monumento memorial. O objetivo desse ato era consagrar a terra como a Terra da Torá e proclamar esse fato a seu respeito, bem como para deixar claro para cada indivíduo da nação que, embora fosse se assentar agora sozinho em sua herança, ele ainda estaria sujeito ao governo de Deus, que o abençoaria ou amaldiçoaria de acordo com o seu cumprimento dos mandamentos estabelecidos pela Torá de Deus.

Neste capítulo, Moisés descreve o futuro que espera pela coletividade. Ele informa à nação o que acontecerá à coletividade caso a nação inteira cumpra a Torá ou deixe de fazê-lo, e que ela pode esperar bênção ou maldição nacional, se a coletividade for fiel ou trair a Torá.

Uma previsão semelhante de encorajamento e repreensão em relação ao futuro da nação já havia sido dado no final de Levítico (capítulo 26). Se compararmos cuidadosamente essas duas previsões, veremos que a diferença entre elas é a seguinte: lá, a Escritura descreve as bênçãos e maldições nacionais em linhas gerais que esboçam principalmente situações da coletividade. Em contraste, a previsão aqui declarada está incluída na coletânea resumida de mandamentos escritos com a divisão da nação em indivíduos espalhados por todo o país. Portanto, ela descreve as bênçãos e maldições nacionais pelo aspecto da porção que o indivíduo toma no destino da nação, de modo que o indivíduo entenda claramente que as coisas dizem respeito a ele pessoalmente e para que ele fique contente pelo sucesso de seu povo ou sofra com o seu sofrimento.

Isso está de acordo com o propósito do DT, apontado por nós diversas vezes, e especialmente com a “responsabilidade” mútua, a associação de todos pelo bem todos e a responsabilidade de todos os judeus uns pelos outros. Essa responsabilidade é expressa no último versículo do capítulo anterior: “Maldito aquele que não confirmar”, e exige que cada membro da nação não apenas observe a Torá ele mesmo, como também promova ativamente a observância geral da Torá de Deus em seu círculo imediato ou mais amplo.

Essa maneira de entender a repreensão coloca ênfase adicional nessa responsabilidade compartilhada ao falar ao coração de cada pessoa, mostrando que, ao promover lealdade à Torá entre as outras pessoas de seu povo, ela garante o seu próprio bem-estar e prosperidade. Por outro lado, enquanto ela não se importar com a traição à Torá por parte de seus irmãos, ela estará contribuindo para a sua própria destruição.

todos os Seus mandamentos. Isto inclui toda a Torá e todas as suas leis no conceito único dos mandamentos do Eterno. Na sequência, a Escritura descreve os resultados da observância da Torá, decorrentes do fato de que o Eterno determina para nós em Seus mandamentos as nossas funções neste mundo, pois Deus criou todo esse mundo de fenômenos e poderes, que inclui a condição, os meios e o conteúdo de nosso ser e de nossa existência terrena, e Deus, que criou esse mundo, também o controla conforme a Sua vontade.

te colocará acima. Se tu anulares a tua vontade diante da vontade Dele, e somente a vontade Dele existir em tua nação, então Ele te elevará acima do caminho natural, elevando-te acima de todas as nações do mundo. Pois as nações do mundo estão em constante conflito com um mundo que se opõe a elas, e precisam lutar contra a natureza e a sociedade humana pelas condições necessárias para sua existência e sucesso.

  1. E virão sobre ti (…) e te alcançarão, pois obedecerás. As bênçãos de florescimento e sucesso virão naturalmente para você sem que você precise pedir por elas. Elas alcançarão você, e você não precisará alcançá-las. Elas não são o propósito das suas ações, nem o objetivo que você procura. Precisamente porque você não as procura, mas apenas deseja fazer a vontade de Deus na terra, e seu objetivo é apenas cumprir seu dever para com Deus e fazer com que a Sua vontade se manifeste no mundo – é justamente por isso que as bênçãos de Deus o buscam e vêm para ajudá-lo em seus empreendimentos, que nada mais são que o cumprimento prático dos propósitos de Deus na Terra.

3-4. Serás bendito. Uma vez que você observa os preceitos morais e sociais, sua vida familiar e comunitária será abençoada. E já que você guarda os mandamentos do trabalho na terra e da criação de animais, seus campos e animais serão abençoados.

E mais, contrariamente aos fenômenos econômicos usuais, a bênção no campo não traz a bênção na cidade; mas “Serás bendito na cidade” e, portanto, “serás bendito no campo”. Visto que a vida do indivíduo e da nação está fundamentada na pureza moral e atinge seu auge na observância dos mandamentos da justiça e da benevolência, portanto, Deus lhe dá Suas bênçãos no campo e abençoa os frutos de seu ventre, sua terra e seus animais. Pois seus filhos nascem para viver uma vida de moralidade, justiça e cumprimento do dever, e aquilo que a natureza física lhe traz transcende em tuas mãos a um trabalho de vida de liberdade moral e lealdade ao dever.

  1. Serão benditos teu cesto e a tua amassadeira. Por isso, o teu cesto (tan’achá) e a tua tigela de amassar (mish’artêcha) serão abençoados. Por isso, a bênção virá até você quando você estiver no campo, com o teu cesto na mão, para colher os frutos que amadureceram e ao preparar o pão em tua casa para tua família comer (“teu cesto e tua amassadeira” são paralelos às primícias e à chalá; ver acima 26:2; Números 15:20 e comentário ali; “e a tua amassadeira” – ver o comentário sobre Êxodo 12:34). E, portanto –
  2. Serás bendito ao entrares e serás bendito ao saíres. Você será abençoado em sua vida doméstica e você será abençoado em sua vida pública.
  3. O Eterno entregará os teus inimigos. O mesmo ocorrerá com as suas relações externas com outros países; você não precisará de nenhuma outra política nacional além da obediência à voz de Deus. Foi Deus quem lhe deu a felicidade de sua casa e de sua cidade, bem como o sucesso de seus campos e animais, e é Ele que mantém você a salvo de qualquer ataque externo. E mais –
  4. O Eterno mandará. Não se trata de uma repetição da bênção da terra prometida nos versículos 4-5, pois se essa fosse a interpretação do versículo, seu lugar deveria ser antes do versículo 6. Mas este versículo é um reforço para todas as bênçãos descritas até agora. Não apenas “E virão sobre ti todas estas bênçãos” (versículo 2), mas “O Eterno mandará que a bênção esteja contigo” – ou seja, o Eterno fará da bênção a tua companheira regular. Tudo que você fizer florescerá e prosperará porque você o faz.

Este é o nível mais elevado que uma pessoa pode alcançar em termos de suas aspirações e realizações, e ela o alcança porque o Eterno lhe favorece e age gentilmente para com ela. Por meio desse nível, ela também é vista por outras pessoas como uma personalidade moral digna da proximidade de Deus. Assim é dito sobre José: “E seu senhor viu que o Eterno estava com ele e, em tudo que ele fazia, o Eterno o fazia prosperar” (Gênesis 39:3). Até mesmo Labão sentiu isso: “pois adivinhei que o Eterno me abençoou por tua causa” (ibid. 30:27). Este é o nível de bênção do qual todo Israel pode se tornar merecedor, contanto que permaneça fiel a Deus em sua própria terra.

nos teus celeiros (baassamêcha). Esse termo só é encontrado novamente no Livro dos Provérbios 3:10. Provavelmente é derivado da raiz som, samem, com a letra álef no início da palavra. Samem é próximo de tsamem – reunir e comprimir. Óssem é sinônimo de otsar (depósito), e “tesouro” também é derivado da raiz de “pacote”, com álef no começo. Assam inclui o que uma pessoa coletou para si, o que acumulou para armazenamento. Em termos aramaicos e linguísticos, sima indica um tesouro precioso (ver, por exemplo, tradução do Onkelos sobre Gênesis 43:23).

9-10. O Eterno levantar-te-á (…) quando guardares. Toda essa bênção chegará a você, porque, caso você guarde os mandamentos de Deus e se esforce para alcançar seus objetivos pessoais e nacionais apenas pelas maneiras que Deus lhe instruiu, então Deus “levantar-te-á” para Si mesmo – ou seja, para os Seus próprios propósitos em prol da humanidade – para ser um povo “santo” adquirido por Ele; um povo distante de tudo o que é grosseiro e baixo; um povo que faz apenas o que é moralmente bom e adequado.

E todos os povos da terra verão que o nome do Eterno é invocado sobre ti. Deus fará tudo isso para que todos os povos da terra – ou seja, as nações do mundo – vejam o que significa ser “o povo do Eterno”, o que significa uma nação inteira – com todos os seus filhos, grandes e pequenos – que submete toda a sua existência e sua vontade, como indivíduos e como público, à vontade de Deus. Eles verão quão grande é a bênção e o poder desse povo, que leva, como dizem os nossos sábios, “o tefilin em sua cabeça” (ver TB Menachót 35b).

e te temerão. Tua grandeza moral e nobreza histórica iluminarão esses povos com tamanho esplendor que, diante de um povo como esse, eles se verão rebaixados e desprezíveis, apesar de seu grande poder e glória. Teu surgimento histórico terá um impacto moral e espiritual sobre a raça humana, e esse é o propósito da tua missão histórica no mundo.

 

Torá Interpretada - Editora Sêfer

Brevíssima coletânea de comentários sobre a Porção Ki Tavô extraída da obra Torá Interpretada à luz dos comentários do Rabino Samson Raphael Hirsch, recém-publicada pela Editora Sêfer.

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