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Contos e parábolas

A obra-prima

por David Gorodovits

 

Por toda parte se comentava a extrema habilidade daquele artista judeu, que parecia ter magia em suas mãos. Madeira e couro, prata e ouro, cobre e pedra, tudo se transformava em obra de arte sob o buril de seu talento.

Todos procuravam adquirir alguma peça de sua produção, e muitos eram os elogios que lhe eram dirigidos em todos os meios de comunicação, mas ele não se sentia feliz.

Instado por sua esposa, explicou o motivo: “Preciso criar uma obra-prima por meio da qual eu possa manifestar ao Eterno minha gratidão pelo dom que Ele me concedeu, e não consigo encontrar uma inspiração apropriada para isso.”

Um dia, avisou a sua esposa: “Vou sair de casa e procurar pelo mundo afora essa inspiração que tanto busco.”

Deixou sua família triste e preocupada e deu início à sua caminhada de pesquisa. Após algum tempo, encontrou um soldado ferido que voltava da guerra e lhe perguntou: “Qual é a coisa mais importante do mundo?” E o soldado prontamente respondeu: “Shalom! A paz!”

Muito alegre, o artista pensou: “Encontrei o tema para minha obra-prima!”

Todavia, por mais que tentasse, não conseguiu imaginar como a paz poderia ser representada e, ante essa dificuldade, resolveu continuar seu caminho.

Mais adiante encontrou um grupo de alunos que saía de sua Yeshivá (escola de formação religiosa) e lhes repetiu a pergunta: “Qual é a coisa mais importante do mundo?” E eles responderam: “Emuná! A fé!”

“Encontrei meu tema”, pensou o artista, para logo depois se decepcionar, pois também não conseguiu imaginar como representar a fé.

Continuando sua caminhada, encontrou um casal de noivos que recém saíra de sob a chupá (pálio nupcial usado durante a cerimônia do casamento judaico) e, ao lhes repetir a pergunta, recebeu por resposta: “Ahavá! O amor!”

A alegria de ter finalmente encontrado o tema que tanto buscava logo se desvaneceu, pois não conseguiu imaginar como representar o amor.

Triste e desiludido, chegou à conclusão de que caminhava em vão e resolveu voltar à sua casa. Chegou ao anoitecer de uma sexta-feira, quando estava por se iniciar o Shabat. Ao abrir a porta, quedou-se estático com o que se deparou: sua esposa, cercada pelos filhos, pronunciava a bênção sobre as velas, que tremulavam sobre os castiçais polidos, fazendo suas chamas se refletirem com múltipla luminosidade sobre a brancura da toalha.

O copo de kidush, herança de seu pai, e a bandeja com as chalot completavam um quadro de onde transcendiam sentimentos de paz, amor e fé, e ele compreendeu que ali se encontrava a mais bela obra-prima que jamais poderia oferecer ao Eterno – um lar plenamente judaico iluminado pelas bênçãos do Shabat.

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