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Pensamento Judaico

Quem dá mais valor aos outros?

Alguns anos atrás, num documentário para a televisão, o Príncipe Charles fez uma famosa afirmação dizendo que gostaria de se tornar “Defensor de Religião” e não “Defensor da Religião”. Na época, a frase causou intensa controvérsia, mas ela merece mais reflexão do que obteve.

Como o futuro líder da Igreja Anglicana pode ser um defensor de outras religiões que não a dele? Ao mesmo tempo, como um futuro rei pode não defender a integridade das muitas comunidades religiosas que compõem a Grã-Bretanha de hoje? Existe algum meio de resolver esse impasse? Eu acredito que sim.

Há muitos anos, quando estudante, conheci um dos grandes rabinos do século 20. Eu estava num momento decisivo do meu próprio desenvolvimento religioso, e fiz a ele a seguinte pergunta: “Eu gostaria de me tornar um judeu mais comprometido, mas eu também valorizo o mundo exterior – a grande música, arte e literatura, cuja inspiração quase sempre vem de fontes não judaicas. Devo fazer esse sacrifício? O compromisso religioso é exclusivo?

Ele respondeu com uma parábola. “Dois homens passaram suas vidas carregando pedras de um lugar para outro. Um deles levava pedras comuns, e o outro, diamantes. Certo dia, aos dois deram esmeraldas para transportar. O homem que tinha passado seus dias carregando pedras comuns encarou as esmeraldas como pedras iguais às outras, um peso sem valor intrínseco. O homem que tinha carregado diamantes reconheceu nelas um outro tipo de pedra preciosa, diferente, sim, mas dona de uma beleza só sua. Com a religião se dá o mesmo. Se sua religião não passa de um fardo para você, você não dará valor à dos outros. Mas se tem amor por ela, valorizará também a dos outros, mesmo sendo diferente da sua. Você entenderá que religiões são como pedras preciosas. Uma delas é especialmente sua, mas todas são preciosas.”

Foi uma resposta sábia, e eu tenho tentado viver de acordo com ela desde então. Muitas vezes encontrei e me emocionei com a sinceridade de cristãos, muçulmanos, hindus, sikhs e budistas. Existe alguma coisa inconfundível nas pessoas cujas vidas foram tocadas pela percepção do mistério no coração do universo. Você sente isso na sua serenidade, delicadeza ou postura interior. Pode ser um sorriso que o inclua num abraço, ou uma risada que o eleve acima da dor e conflito do mundo, ou um amor que o surpreenda por sua generosidade. Pessoas assim nos validam e nos fazem maiores.

Num nível além das palavras, a fé envia sua luz à fé. Aqueles que a reconhecem em si mesmos são capazes de senti-la em outras pessoas. Assim como um pintor pode encontrar inspiração no trabalho de artistas de outras épocas e estilos, alguém que tem fé pode se sentir revigorado pelos ecos distantes da presença de Deus em outras tradições, outras vidas. Saber que outros encontram Deus de maneiras diferentes não enfraquece minha fé. Na verdade, fortalece minha convicção de que Deus está além das particularidades de linguagem, tempo e cultura, sempre nos surpreendendo por estar nos lugares mais inesperados.

Longe de ser paradoxal, faz muito sentido dizer que aquele que defende uma religião em particular está em melhor posição para defender outras religiões. Se tivéssemos de confiar nossa possessão mais preciosa a alguém, quem escolheríamos? Com certeza, alguém que possui seus próprios tesouros e, por isso, sabe o valor do que tem para proteger.


Conheça o Rabino Jonathan Sacks, o Rabino do Mundo


 

Celebrando a Vida

Trecho extraído do livro Celebrando a Vida- Encontrando a felicidade em lugares inesperados
Autor: Jonathan Sacks
Editora Sêfer
Páginas: 233

Logo depois da grande dor causada pela morte de seu pai, o Rabino-Chefe Lord Jonathan Sacks começou a aprender uma nova maneira de celebrar a vida. Descobriu que a felicidade mora, muitas vezes, em lugares inesperados dentro de uma família, de uma comunidade, das amizades e responsabilidades. Ele também a encontrou por meio de um relacionamento renovado com Deus que fala às nossas necessidades mais profundas.

Celebrando a Vida é um livro para pessoas de todas as crenças e de nenhuma. Ele nos ensina a ser mais humanos e a chegarmos, assim, mais perto de Deus.

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