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Contos e parábolas

O país da escassez

por David Gorodovits

 

Existiu certa vez um país cujo solo era muito árido, que exigia muito esforço para produzir algo, fazendo com que fosse escasso o alimento para todos os seus habitantes.

O rei recomendava a seus súditos que comessem com moderação, para que todos tivessem a possibilidade de conseguir os alimentos necessários à sua sobrevivência.

Um dia, os ministros fizeram um relato ao rei sobre um súdito que era um incorrigível glutão, que devorava alimentos sem conta, deixando outros sem suas cotas.

O rei resolveu dar uma punição exemplar ao súdito que, não somente desobedecia a recomendação de seu soberano, como também demonstrava sua absoluta falta de solidariedade para com seus compatriotas. Convidou o glutão para um almoço no palácio real e fez com que fossem servidas as mais deliciosas iguarias em grandes quantidades.

O conviva fartou-se a comer e repetir de tudo, até um ponto em que se declarou incapaz de comer qualquer coisa mais. O rei insistiu várias vezes para que ele novamente se servisse de algum dos pratos que continuavam na mesa, mas recebeu repetidas negativas sob a alegação de que não havia mais espaço em seu estômago para qualquer porção de alimento, por menor que fosse.

Então o rei mandou trazer uma sobremesa excepcionalmente atraente e o glutão não conseguiu resistir à tentação e, avidamente, colocou em seu prato uma grande porção, que devorou de imediato.

Disse-lhe o rei: “Eu te condeno à morte, por ter mentido a seu rei! Pois após afirmar que nada mais poderia comer, você devorou um prato de sobremesa”.

Pensando rapidamente sobre como se livrar da situação, o condenado respondeu: “Peço a Vossa Majestade que me conceda um último desejo. Leve-me ao menor cômodo que há no palácio”.

Embora estranhando o pedido, o rei resolveu atendê-lo e o levou, acompanhado pelos soldados da guarda, até um ambiente de dimensões mínimas.

“Peço que o rei ordene para que entrem aqui tantos soldados quanto o espaço permitir”.

Ante a ordem do rei, conseguiram entrar no cômodo 12 soldados, lotando-o completamente.

“Crê o rei que ainda possa entrar mais alguém aqui?”, perguntou o glutão.

“Certamente que não. Não há mais espaço para ninguém”, respondeu o rei.

O glutão exclamou então: “Atenção, soldados! O rei vai entrar neste quarto!”

Os soldados se amontoaram, uns subindo nos ombros dos outros, até se penduraram no lustre, e conseguiram abrir espaço para que o rei entrasse.

“Vê, Majestade, como embora parecesse não caber mais ninguém, fez-se espaço ao ser anunciado que o rei iria entrar! Da mesma forma, nada mais caberia em meu estômago, mas diante da rainha das sobremesas, de imediato se fez lugar.”

O glutão foi perdoado e saiu do palácio com a recomendação de dominar sua gula e respeitar as ordens do rei, para considerar o direito à alimentação daqueles que dela seriam privados por quem comesse demais.

*

Em nossa vida, tendemos a considerar que não temos tempo para mais nada, a não ser para as tarefas que desempenhamos para assegurar nossa sobrevivência e para o lazer que, às vezes, buscamos desenfreadamente. Os judeus, porém, lembram que a Torá, dada pelo Eterno, é a rainha que traz alimento espiritual para suas almas e que norteia suas boas ações e, diante desta certeza, conseguem abrir espaço para se dedicar também ao seu estudo.

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