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Mística Judaica

Pensando como um cachorro

Pode-se argumentar que os animais não pensam e, sim, agem apenas por instinto; eu garanto que isso não pode ser comprovado. Você nunca viu um cachorro em estado contemplativo, como se estivesse pensando em alguma coisa? Como, por exemplo, quando seu cachorro está sentado no seu carpete branco. Daí ele se levanta e começa a andar em círculos, olhando para você e para o carpete, para você e para o carpete. Você não sente que ele está tentando tomar uma decisão?

A questão é: quais são os fatores envolvidos no processo de tomada de decisão do cachorro? Talvez ele esteja pensando: “Fazer ou não fazer xixi? Eis a questão. O que é mais nobre para um cachorro como eu? O que é certo? O que é errado? O que é vida? O que é verdade? Isso seria um ato bom? Seria ruim? Qual é o propósito da vida? Será que este ato está em sintonia com o que realmente quero ser? Talvez a vida seria mais fácil se eu fosse um gato…”

Alguma dessas perguntas faz parte do “raciocínio” do cachorro? Ou talvez ele esteja realmente pensando: “Hum, será que vou me dar bem nessa? Ou vou ganhar uma pancada de jornal por ter arruinado o carpete?” É esse instinto mais básico de sobrevivência que associamos aos animais – um cálculo de causa e efeito, de “o que é que eu ganho com isso?” É dessa maneira que o nosso “lado animal” funciona. Questões sobre qualidade de vida, verdade, ideal e significado – se algo expressa o significado fundamental da existência – associam-se a um nível mais alto de autoconsciência, e não apenas a um mero instinto de sobrevivência. É nisso que consiste a alma Divina.

A alma é o seu “eu interior”. Você conhece Hashem por meio da sua alma. Na verdade, é impossível conhecer Hashem a menos que, primeiro, você se aprofunde na sua própria alma e no conhecimento de si próprio. Intuitivamente, a alma sabe o que é verdade; ela o atrai para Hashem, porque, de acordo com a Torá, a alma é um sopro de Hashem.

Na história da Torá da criação de Adão e Eva, o primeiro ser humano é feito de barro, de lama. E então Hashem expira dentro desse bolo de argila e lhe dá vida. É por isso que as palavras em hebraico “respirar”, neshimá, e “alma”, neshamá, são quase idênticas.

Se você já fez respiração boca-a-boca em alguém, sabe o que acontece nessa hora. O salva-vidas expira seu ar, uma parte de si mesmo, na pessoa que está lá deitada, sem vida. Foi isso que aconteceu conosco quando nos foi dado o sopro da vida e a iluminação da consciência. Recebemos um aspecto de Hashem: a alma – o nosso eu interior.

A Cabalá usa uma metáfora um pouco diferente para explicar este aspecto. Você se lembra da história dos recipientes nos quais Hashem projetou a Luz Infinita? Essa Luz também é uma metáfora para alma, a luz da consciência. A Cabalá diz que, dos cinco níveis da alma, os três primeiros são como graus de luz que entram em nossos corpos. Os dois últimos são como uma luz que nos cerca. A alma é uma luz interior – imanente – e também uma luz exterior e abrangente – transcendente.

O primeiro nível da alma, néfesh, nos confere um “saber intuitivo” que não poderíamos adquirir no mundo externo. Sentimos que esse tipo de conhecimento é bastante profundo e real, como algo que sabemos dentro de nós mesmos. Intuímos que os nossos atos podem ser significativos.

Não seria possível atender a um pedido como: “Quero ver o significativo, pegue-o e coloque-o numa caixa.” Mas mesmo assim você tem certeza de que, quando dá dinheiro a uma pessoa necessitada, faz um ato de caridade significativo. Como sabe disso? Como pode provar? Você não pode colocar o seu gesto de caridade num microscópio e examiná-lo fisicamente. Mas isso não importa porque você sentiu que o que fez é significativo. Você sabe disso dentro de si. A sua néfesh lhe dá o senso de que suas ações podem ser significativas – devem ser significativas.

Extraído da obra Luz Infinita, do Rabino David Aaron

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